Entendendo a decisão: o que o STF decidiu sobre a licença da mulher não gestante na relação homoafetiva?

Por Carlos Eduardo Amaral, advogado trabalhista, sócio do Cheim Jorge Abelha Rodrigues

O STF decidiu questão extremamente relevante sobre o direito à licença de mulher não gestante na relação homoafetiva em razão de gravidez da companheira, analisando a situação de um casal de mulheres com gravidez decorrente de inseminação artificial. Trata-se do pleito da mulher não gestante, servidora municipal, que decorreu do fato de que a companheira que engravidou era trabalhadora autônoma e não tinha como se afastar de suas atividades, havendo necessidade de que ela ficasse responsável pelos cuidados do bebê. Assim foi pleiteado o direito à licença de 180 dias. O Município não concordava com a concessão da licença em razão de não haver previsão legal de afastamento de servidora não gestante.

No STF o Ministro Relator, Luiz Fux, decidiu favoravelmente ao direito à licença-maternidade para a servidora, afirmando que este afastamento corresponde a uma proteção constitucional tanto para a criança quanto para a mãe, devendo ser mantida independentemente da origem da concepção e configuração familiar. “O reconhecimento da condição de mãe à mulher não gestante em união homoafetiva, no que se refere à concessão da licença-maternidade, tem o condão de fortalecer o direito à igualdade material e, simbolicamente, de exteriorizar o respeito estatal às diversas escolhas de vida e configuração familiares existentes”, completa o magistrado.

O STF já possui entendimento formado, desde 2011, de que os casais constituídos de pessoas do mesmo sexo possuem direito à mesma proteção dada pela Constituição às famílias formadas por casais heteroafetivos, conforme estabelecido na ADI 4.277 e na ADPF 132 (Rel. Min. Ayres Britto, j. em 05.05.2011).

O Ministro considerou o posicionamento já adotado pelos Tribunais de que a licença-maternidade é um benefício previdenciário que busca proteger a maternidade e a criança, sendo certo que já há entendimentos de que a licença alcança também mães adotivas, não havendo justificativa para que não alcancem as mães não gestantes em união homoafetiva. Na avaliação do ministro, diante da ausência de legislação que proteja suficientemente as entidades familiares diversas e, especialmente, as crianças integrantes dessas famílias, cabe ao Judiciário fornecer os necessários meios protetivos. Para ele, é dever do estado assegurar especial proteção ao vínculo maternal, independentemente da origem da filiação ou de configuração familiar. […]

Nesse sentido, Fux acrescentou que o caso dos autos deve ser visto também sob o prisma do princípio da igualdade. “A circunstância de ser mãe é, no meu modo de ver, o bastante para se acionar o direito, pouco importando o fato de não ter engravidado”, disse, completando ainda que o reconhecimento deste direito tem efeito duplo: na proteção da criança, que não escolhe a família onde nascer, e na proteção à mãe não gestante em união homoafetiva, “escanteada por uma legislação omissa e preconceituosa”, conforme infomações do site do STF.

O reconhecimento do direito à licença maternidade foi unânime, havendo divergência apenas em relação a quem este direito alcançaria: se apenas a uma das mulheres ou a ambas. Foi instaurada uma divergência pelo Ministro Alexandre de Moraes que entendeu que a licença deve ser para ambas as mulheres, pois ambas ostentam a condição de mãe. O Ministro Relator votou pela extensão da licença-maternidade apenas para uma das mulheres, ao passo que para a outra seria assegurada o prazo de licença-paternidade.

Prevaleceu a tese do Ministro relator, sendo instaurada a tese jurídica em Repercussão Geral de que “A mãe servidora ou trabalhadora não gestante em união homoafetiva tem direito ao gozo de licença-maternidade. Caso a companheira tenha utilizado o benefício, fará jus à licença pelo período equivalente ao da licença-paternidade”.

Assim, ficou garantido o direito à licença maternidade para uma das mulheres, ainda que não seja a gestante, desde que a companheira gestante não tenha usufruído do mesmo direito. Caso haja licença-maternidade pela mulher gestante, a não gestante terá direito apenas ao período de licença-paternidade correspondente.

Esta tese alcança tanto servidoras públicas como trabalhadoras da iniciativa privada pelo regime da CLT, pois não haveria sentido algum fazer distinção entre as mulheres em razão do seu vínculo.

Pela legislação trabalhista, a licença-maternidade corresponde a um período de 120 dias, mas há situações em que ela pode ser estendida, dependendo de normas coletivas. No âmbito do serviço público, é importante verificar o regulamento do órgão ao qual a mulher está vinculada.

Por sua vez, a licença-paternidade tem prazo geral de cinco dias, cabendo também a mesma análise: normas coletivas da categoria e regulamento do órgão ao qual a mulher está vinculada.