Parcerias Público-Privadas: entenda como elas transformam as cidades

Quem ganha com as Parcerias Público-Privadas é a população, que já sente em seu cotidiano a melhoria dos serviços públicos

Artigo publicado no Folha Vitória dia 30/04/2025

Por Flavio Cheim Jorge, advogado sócio fundador do CJAR

Conjugando investimento e conhecimento da iniciativa privada e dividindo responsabilidades com o Poder Público, as PPPs têm se tornado uma realidade e, porque não dizer, uma necessidade, na implementação de políticas públicas em áreas essenciais para a população, como saúde, mobilidade urbana, energia, lazer e educação.

Em meio ao reconhecimento público de que municípios, estados e União não têm condições de sozinhos realizar obras públicas com eficiência e prestar serviços essenciais de modo apropriado, as Parcerias Público-Privadas (PPPs) foram instituídas em 2004, pela Lei 11.709, com o intuito de atrair a iniciativa privada a fim de auxiliar o Estado na consecução desses objetivos.

Parcerias Público-Privadas: risco compartilhado

Aliando o conhecimento técnico e as injeções financeiras do parceiro privado à logística e ao investimento do Poder Público, bem como compartilhando os riscos do empreendimento, as PPPs vêm se revelando uma importante ferramenta para aprimorar os serviços básicos prestados à população.

A Lei federal 11.709/2004, que regulamenta as PPPs, estipula regras rígidas em relação a esse tipo de contratação, prevenindo possibilidade de fraude, de descontrole dos recursos públicos e do aproveitamento do privado sobre coisa pública.

Exige-se concorrência pública (licitação) para escolha do parceiro privado e contrato baseado em desempenho, com metas e indicadores de serviço bem definidos.

Além disso, o contrato de PPP deve estar alinhado ao planejamento orçamentário (PPA, LDO e LOA) do ente público e os compromissos futuros precisam ser registrados como despesas de caráter continuado, respeitando a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

É necessário, ainda, que cada ente crie uma unidade de gestão específica das PPPs, bem como que publique relatórios anuais sobre a execução dos contratos, garantindo o controle social.

Ademais, as PPPs preveem a distribuição adequada de riscos entre as partes.

Alocação que visa à eficiência

Em regra, riscos operacionais e de construção tendem a ficar com o privado, enquanto riscos de mudanças legais ou de demanda excepcional podem ser compartilhados ou assumidos pelo público. Essa alocação visa à eficiência – cada risco com quem pode melhor geri-lo.

No setor da saúde, uma referência pioneira é o Hospital do Subúrbio, em Salvador (BA), inaugurado em 2010 como a primeira unidade hospitalar pública gerida via PPP no país.

Nela, o ente privado construiu e opera o hospital, cabendo ao governo pagar uma contraprestação atrelada a metas de atendimento pelo SUS. Esse projeto ganhou prêmios internacionais pela inovação no modelo de gestão e resultados assistenciais.

Primeira PPP de educação do Brasil

No setor de educação, o caso paradigma é o de Belo Horizonte (MG), que lançou, em 2012, a primeira PPP de educação do Brasil.

Conhecida como projeto Inova BH, essa parceria envolveu a construção de novas escolas municipais e gestão de serviços não pedagógicos.

Foram construídas 51 novas escolas de educação infantil e fundamental, atendendo cerca de 25 mil alunos de 0 a 14 anos.

Iluminação pública em Belo Horizonte

No segmento de iluminação pública, um exemplo destacado é o também de Belo Horizonte (MG), que foi a primeira capital a concluir a conversão total da iluminação pública para LED via PPP.

Capitais como São Paulo (SP), Porto Alegre (RS), Recife (PE), Manaus (AM) e Aracaju (SE) também firmaram PPPs de iluminação nos últimos anos, todas com o objetivo de modernizar instalações antiquadas, reduzir custos e melhorar a qualidade do serviço.

VLT Carioca na área de mobilidade urbana

Na área de mobilidade urbana, sublinha-se o VLT Carioca e, ainda no Rio de Janeiro, a PPP da ViaRio (TransOlímpica); em Salvador (BA), destaca-se a PPP da Linha 1 e 2 do Metrô de Salvador e do VLT do Subúrbio.

Os serviços públicos de saneamento básico sofreram forte impulsionamento pela Lei 14.026/20, que instituiu o novo marco legal para esse setor e estipulou metas de universalização que garantam o atendimento de 99% (noventa e nove por cento) da população com água potável e de 90% (noventa por cento) da população com coleta e tratamento de esgotos até 2033.

O Estado do Espírito Santo (ES) merece destaque com projetos inovadores tanto sob condução estadual quanto municipal.

Projetos na área de saneamento no ES

Região Metropolitana de Vitória implementou PPPs para universalizar o esgotamento sanitário nesses três grandes municípios (Serra, Vila Velha e Cariacica), através de contratos em parceria com a CESAN, caracterizando um modelo híbrido público-privado.
O impacto local dessas PPPs de saneamento é transformador.

Na Serra, em 2014 apenas 42% da população tinha coleta/tratamento de esgoto; hoje, passados 9 anos, esse índice ultrapassa 85%, a caminho da meta de 95%.

Em Vila Velha, o contrato já levou a rede para bairros historicamente carentes como Terra Vermelha e Cobilândia, ao passo 95% das áreas urbanas serão atendidas até 2027, beneficiando cerca de 200 mil habitantes adicionais com esgotamento sanitário.

Cariacica, que tinha menos de 40% de cobertura, já superou 60% e avança rapidamente para atingir 90% até 2030.

De mais a mais, Vila Velha, município de aproximadamente 500 mil habitantes, firmou em outubro de 2020 uma PPP para modernizar 100% de sua iluminação pública.

O escopo compreendeu a substituição de mais de 35 mil luminárias antigas por LED, implantação de telegestão em parte delas e manutenção/operação de todo o parque por 20 anos.

Resultados positivos e rápidos

Os resultados locais dessa PPP têm sido muito positivos e rápidos. Já em março de 2023, 100% das luminárias de Vila Velha eram LED, tornando-a uma das primeiras cidades brasileiras totalmente iluminadas em LED.

O governo estadual também avançou com PPPs em outras áreas. Um caso concluído foi a PPP “Faça Fácil”, que implantou unidades de atendimento integrado ao cidadão (similar ao Poupatempo/SP) em cidades do interior.

Essa PPP, iniciada em 2014, construiu e opera postos em Colatina, Cachoeiro e Serra, onde o cidadão pode acessar dezenas de serviços públicos em um só lugar (emissão de RG, CNH, documentos, etc.).

PPP de construção e operação de presídios

Por fim, no âmbito prisional, o ES aprovou em 2024 estudos para uma PPP de construção e operação de presídios.

A ideia é contratar uma empresa para construir até três unidades prisionais (criando 2.400 vagas) e prestar serviços de apoio aos detentos (alimentação, limpeza, assistência médica e psicológica, etc.), ficando a cargo do Estado apenas a custódia e segurança interna.

Se concretizada, será a primeira PPP penitenciária do ES, com impacto potencial de diminuir a superlotação e reincidência criminal, segundo o projeto aprovado. Embora ainda em fase de estudos, ilustra a diversificação das PPPs capixabas.

Diante de projetos em que os aportes públicos e a receita tarifária, sozinhos, são insuficientes para consolidá-los, as PPPs apresentam-se como uma alternativa potente para ampliar investimentos e melhorar serviços, conciliando recursos privados com interesse público.

Projetos de grande porte sem sobrecarregar o erário

Do ponto de vista da Administração Pública, a vantagem é possibilitar projetos de grande porte sem desembolso inicial integral do erário.

O parceiro privado injeta capital para construir infraestrutura ou melhorar serviços que a administração sozinha talvez não conseguisse bancar.

Além disso, é expressivo o ganho em eficiência e tecnologia. PPPs, quando bem estruturadas, incorporam novas metodologias de gestãosistemas de monitoramento, avaliação de desempenho e expertise da iniciativa privada para a prestação de serviços públicos.

É preciso vencer o preconceito da falta de confiança em relação setor privado, pois, ao fim e ao cabo, quem ganha com as PPPs é a população, que já sente em seu cotidiano a melhoria dos serviços públicos.

Flávio Cheim Jorge

Colunista

Advogado nas áreas do direito cível, empresarial e administrativo, é Mestre e Doutor pela PUC/SP, sendo ainda, Professor Titular na Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). Já exerceu o cargo de Juiz Eleitoral Titular – classe dos Juristas – no Tribunal Regional Eleitoral do Espírito Santo (TRE-ES)