Prevenção de acidentes no trabalho: Proteção da vida aliada à vantagem competitiva – Por Alex de Freitas Rosetti no Migalhas

A prevenção de acidentes deve ir além do cumprimento legal, integrando-se à governança corporativa como valor estratégico para a proteção da vida e a reputação empresarial.

Artigo publicado de Alex de Freitas Rosetti publicado no Portal Migalhas no dia 23 de julho de 2025.

Em um país que contabiliza centenas de milhares de acidentes de trabalho a cada ano, o Dia Nacional de Prevenção de Acidentes de Trabalho, celebrado em 27 de julho, deve ser mais do que uma data simbólica: trata-se de um ponto de inflexão. Um convite firme – e inadiável – para que lideranças empresariais revisitem suas prioridades, reavaliem a cultura organizacional e assumam, com responsabilidade efetiva, o compromisso com a integridade daqueles que constroem diariamente os resultados do negócio.

Durante muito tempo, prevenir significou apenas cumprir protocolos: distribuir EPIs, emitir laudos, assinar programas. Mas o tempo do formalismo se esgotou. A prevenção que realmente protege exige estratégia, consciência e posicionamento institucional. E as empresas que compreendem isso não apenas evitam passivos – constroem uma cultura que preserva vidas, projeta confiança e gera valor duradouro.

Do cumprimento ao compromisso: a evolução necessária

A legislação brasileira – especialmente a CLT e as NRs – estabelece um conjunto de deveres inquestionáveis aos empregadores: assegurar ambientes seguros, mapear e mitigar riscos, implementar programas de saúde ocupacional e promover a capacitação contínua das equipes. Trata-se do ponto de partida. Mas, para empresas que almejam relevância e longevidade, proteger a vida e promover o bem-estar de suas equipes deve estar no centro das decisões estratégicas – e não na margem da burocracia.

O ambiente empresarial contemporâneo é avaliado por critérios que vão além da formalidade documental. Ética, responsabilidade socioambiental e cultura preventiva estão no núcleo da reputação corporativa. Investidores, contratantes, clientes e colaboradores estão atentos. E esperam mais do que reações. Esperam liderança.

As organizações que compreendem a prevenção como expressão de governança não apenas cumprem normas: transformam exigências em cultura, riscos em reputação e conformidade em valor competitivo. É nesse espaço – entre a obrigação legal e o propósito institucional – que se constrói a verdadeira vantagem estratégica.

Os ganhos invisíveis da prevenção

Acidentes de trabalho impõem custos tangíveis: indenizações, afastamentos, reestruturações emergenciais, perda de produtividade. Mas seus efeitos mais profundos – e, portanto, mais perigosos – são os que não aparecem nos balanços contábeis.

Há impactos silenciosos que fragilizam, de dentro para fora, a estrutura da empresa:

A erosão da confiança nas lideranças;
O desgaste da imagem perante clientes e parceiros;
A queda no engajamento e no senso de pertencimento das equipes;
O aumento da rotatividade e a dificuldade de reter talentos;
A desconexão com práticas esperadas por padrões ESG.
Segundo o Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho, o Brasil registra mais de 600 mil acidentes laborais por ano. Mesmo os casos menos graves sinalizam falhas evitáveis e lacunas de gestão. Cada incidente é uma oportunidade perdida de demonstrar cuidado, planejamento e coerência institucional.

Em um ambiente em que empresas são avaliadas não apenas por seus produtos, mas pelos valores que sustentam suas decisões, a omissão custa caro – e o preço, muitas vezes, é a confiança.

Segurança como ativo institucional

Organizações que incorporam a saúde e a segurança como valores estruturais – e não como respostas pontuais – superam a lógica defensiva da conformidade e ingressam em um patamar superior de gestão.

São essas empresas que:

Alcançam posições de destaque em auditorias, certificações e concorrências qualificadas;
Tornam-se parceiras preferenciais de investidores e contratantes sensíveis à integridade operacional;
Demonstram boa-fé e diligência reconhecidas no contencioso trabalhista e na gestão de riscos;
Constroem marcas sólidas, coerentes e legitimadas socialmente.
Em um mercado guiado por transparência, responsabilidade e consistência, a prevenção se consolida como um ativo intangível de alta relevância. Ela comunica visão, respeito à vida humana e compromisso com o futuro.

O jurídico como força estruturante da cultura preventiva

A construção de uma cultura preventiva duradoura exige articulação entre múltiplas áreas. E o jurídico, embora muitas vezes atuando nos bastidores, é um dos pilares desse processo. Integrado ao RH, ao SESMT e às lideranças operacionais, o setor jurídico contribui para:

Validar tecnicamente práticas e políticas internas;
Antecipar riscos legais e evitar conflitos normativos;
Fortalecer a governança institucional com base em critérios de conformidade e sustentabilidade.
Essa constatação nasce da prática: em mais de duas décadas assessorando empresas dos mais diversos segmentos, é evidente que as que tratam a prevenção como eixo de gestão colhem resultados consistentes, sustentáveis e alinhados ao seu propósito empresarial – com respeito genuíno à vida e à dignidade do trabalho.

Conclusão: o legado de uma nova mentalidade empresarial

Neste 27 de julho, mais do que relembrar estatísticas ou cumprir rituais formais, é tempo de agir com coragem, lucidez e visão de longo prazo. Prevenir acidentes não é apenas proteger vidas – é consolidar, na prática, os valores que sustentam empresas éticas, humanas e competitivas.

Empresas que fazem da cultura preventiva uma diretriz permanente não apenas evitam riscos: elevam seu padrão de gestão, atraem parceiros estratégicos e conquistam legitimidade perante um mercado cada vez mais exigente e consciente.

Ir além da conformidade legal é um gesto de liderança silenciosa, mas profundamente transformadora. É o que distingue negócios que reagem dos que inspiram. Os que operam no presente dos que constroem o futuro.

A prevenção não é custo. É escolha. É legado.

E quem escolhe cuidar, escolhe permanecer.

Alex de Freitas Rosetti – Advogado sócio do escritório Cheim Jorge & Abelha Rodrigues Advogados Associados. Especialista em Direito do Trabalho pela Universidade Cândido Mendes e especialista em Direito Empresarial pela Faculdade de Direito de Vitória (FDV). Atua nas áreas Consultiva e Contenciosa em Direito do Trabalho, Processual do Trabalho e Previdenciário.