Autoras: Christina Cordeiro dos Santos e Thamires Almeida Marcarini são advogadas e integrantes do Cheim Jorge e Abelha Rodrigues Advogados Associados
O Supremo Tribunal Federal decidiu, à unanimidade, que nos casamentos e nas uniões estáveis envolvendo pessoas maiores de 70 (setenta) anos, o regime de separação de bens previstos no art. 1.641, II, do Código Civil, poderá ser afastado por expressa manifestação de vontade das partes mediante escritura pública (Tema 1.236 do STF). Isto é, a partir de agora, os maiores de 70 (setenta) anos que se casarem ou iniciarem uma união estável poderão, por meio de escritura pública, afastar o regime de separação de bens, para aplicarem o regime que melhor se adequar ao relacionamento.
O art. 1.641, II, do Código Civil estabelece a obrigatoriedade do regime de separação de bens no casamento quando um dos nubentes for pessoa maior de 70 (setenta) anos. Embora o dispositivo se refira ao casamento, a limitação se aplica também aos que iniciem/mantenham união estável após os 70 (setenta) anos (súmula 655 do STJ e RE n° 878.694 e 646.721). Ou seja, com base no art. 1.641, II, do Código Civil, até a decisão do STF do dia 1º/02/2024, era vedado ao maior de 70 (setenta) anos estipular livremente o regime de bens aplicado ao seu casamento ou à sua união estável.
O objetivo do legislador com o dispositivo era proteger o idoso e seus herdeiros de casamentos realizados por interesse estritamente patrimonial. No entanto, segundo o Ministro Luís Roberto Barroso, relator do caso apreciado, a obrigatoriedade do regime de separação de bens aos maiores de 70 (setenta) anos de idade viola o princípio da dignidade da pessoa humana, limita a autonomia da vontade e utiliza a idade como fator de desequiparação entre pessoas.
Além disso, os cônjuges ou companheiros que neste momento já se encontram submetidos ao regime de separação legal poderão, caso queiram, alterar o regime de bens, o que é possível por meio de ação judicial, com fulcro no art. 1.640, parágrafo único, do Código Civil, e art. 734 do Código de Processo Civil.
Em relação às ações de alteração de regime de bens, merece especial atenção o fato de que a sentença que altera o regime de bens possui, em regra, efeitos ex nunc, ou seja, os efeitos da sentença não atingem o patrimônio constituído antes do trânsito em julgado da sentença. No entanto, no caso de alteração do regime de separação de bens para o de comunhão universal opera-se claramente a eficácia ex tunc, em outros termos, a mudança de regime de bens atinge todos os bens já constituídos pelos cônjuges/conviventes.
No mais, deverão os ascendentes dos nubentes acima de 70 (setenta) anos ponderarem cada vez mais a higidez mental do genitor que pretenda contrair núpcias/união estável ou alterar o regime de bens.
O entendimento firmado pelo do STF em repercussão geral poderá levar ao aumento de ações de interdição proposta pelos descendentes do idoso, no aumento da discussão no direito sucessório quanto à higidez mental do falecido no momento da escolha do regime de bens e, ainda, no aumento das ações de alteração de regime de bens.